sábado, 10 de outubro de 2009

Doce Urandi

DOCE URANDI

Era meados do mês de julho de 1989, sol escaldante e muita poeira , e ali naquela estrada quase deserta, procurava ansiosamente chegar a então desconhecida Urandi, minha primeira Comarca. Já se aproximava do meio dia e o carro guiado por um senhor da vizinha cidade de Guanambi rumava vagarosamente. Calado, absorto, permitia que meu pensamento alçasse vôos mirabolantes, no sentido de saciar minha curiosidade. Como seria a cidade? O seu povo? Como seria o meu comportamento diante de tão difícil desafio? Minha família se adaptaria a nova cidade? Diante do desconhecido e dos desafios da carreira de magistrado todas essas indagações fervilhavam na minha mente, entretanto, algo forte que partia de dentro de mim irradiava energia e muita confiança para enfrentar os obstáculos e obter sucesso no desafio.

Já passava do meio-dia, quando do alto da estrada avistei Urandi, guardada dentro de um vale, cercada pela serra dos Gerais, que se estende até o Estado de Minas Gerais. A cidade de Urandi com pouco mais de quinze mil habitantes situa-se na Região sudoeste da Bahia e fez divisa com a cidade mineira de Espinosa, tendo na pecuária e algodão suas principais atividades econômicas. O fórum fica localizado na Praça da Bandeira, ponto central da cidade, onde também se localizam a Prefeitura, a Igreija e as duas únicas agências bancárias. O clima é quente e seco, sendo a terra severamente castigada pelas longas estiagens, entretanto, quando chega a chuva do umbu, o verde aparece resoluto para protestar que a terra é fértil. Não posso esquecer do trem que caprichosamente deslizava lá no alto da serra dos gerais transportando minerais para outras cidades. Era impossível não embarcar nas asas da imaginação do trenzinho e conhecer as paisagens do sertão e segredos escondidos por trás das serras dos gerais.

O tempo passou e no cotidiano da pequena cidade aprendi a gostar daquela gente simples, alegre e sofrida, que ainda acredita no futuro e sabe entoar a verdadeira música da fraternidade humana. O Dr. Roberto Dantas, advogado residente na cidade, certa vez me confidenciou que a pessoa que bebesse da água de Urandi não mais a esqueceria. Parece que a lenda se tornou realidade, pois Urandi conquistou definitivamente meu coração de sertanejo, que nasceu nas barrancas do São Francisco, precisamente, em Bom Jesus da Lapa. A idéia que fica nos leva a crer , que foi erigida uma gigantesca barreira naquele local para proteger seu povo das maledicências e da podridão humana, pois o que ali grassa , na verdade, são os valores mais caros do ser humano, que transforma o seu povo num verdadeiro tesouro muito raro, difícil de se encontrar em outras plagas.

No campo profissional tive o privilégio de trabalhar com um corpo de serventuários exemplar, sempre dedicado ao trabalho e pronto para obedecer ás ordens, apesar do salário aviltado. Não posso esquecer da figura altiva de Teódulo, servidor probo e dedicado, que aproveitava o final de semana para colocar o trabalho em dia, mas que na hora de lazer soltava a alma de criança e pilheriava das estórias de ilustres urandinenses, inclusive, de Edílson. Na memória permanece viva a imagem do Sr. Vivaldo, homem de reconhecido preparo espiritual, que mesmo depois de aposentado não esqueceu o caminho do fórum. Não posso esquecer do meu amigo Edílson, servidor polivalente e torcedor do timão. Não poderia esquecer do violão de Didi e de seu filho, Sergio, que embalaram muitas serestas sob o testemunho singular do luar do sertão.

O tempo passou e a amizade se consolidou gradativamente. Não posso continuar a descrever, pois tornaria o texto por demais longo. Na verdade, quero expressar que tive o privilégio de viver momentos inesquecíveis e conviver com pessoas maravilhosas e de alma grande, como dona Chica, Terezinha, Dona Ana, Dr. Dantas e sua estima esposa, Edite, que me ensinaram a acreditar nos valores da amizade, honestidade, paciência e amor. A terrinha do ilustre maestro Fred Dantas mora no meu coração e agora, após o transcurso de quase um lustro da minha investidura como Juiz de Direito da Comarca de Urandi, posso assegurar que o desafio foi vencido, as indagações respondidas positivamente e a experiência valeu, pelo muito que me enriqueceu espiritual e profissionalmente, recheando os momentos que por ali compartilhei com minha esposa Rosana e filhos, de muita emoção, ternura e alegria irradiada pelos sertanejo forte e humilde da minha doce e inesquecível URANDI.



* Marcos Bandeira – Juiz de Direito da Vara do Júri da Comarca de Itabuna e Professor de Direito da UESC.

3 comentários:

  1. Dr. Marcos,

    Sirvo-me deste em nome dos Urandienses para parabenizá-lo pelo texto retratando sobre Urandi e o povo da nossa querida municipalidade.
    Na certeza que irá ficar satisfeito em anexar o texto do seu Blog no Blog da História Real de Urandi-Ba. afim do fácil acesso.
    Segue endereço do mesmo: http://historiadeurandi.blogspot.com/
    atenciosamente,

    João Ezequiel Filho
    Autor do Blog

    ResponderExcluir
  2. Dr Marcos..
    Que alegria saber que tão nobre homem e sua família residiram um dia nas terras de Urandi.
    Dificil encontrar alguem que conheça aquele pedacinho do mundo...Sou filha de lá!!!
    Amei o seu texto, reafirmo que é uma honra para nós filhos da terrinha ouvi-lo falar com tamanha ternura deste seu capítulo da vida.
    DEUS te abençoe!!!

    ResponderExcluir
  3. Prezada Acácia,
    Muito Obrigado por suas palavras generosas, todavia, não me sinto nobre. Creio que já fui abençoado por DEUS por ter a família que tenho, os amigos que sonhei e por ter tido o privilégio de conviver com a gente boa de Urandi, onde cultivei amizades sólidas e duradouras.
    Um grande abraço extensivo a toda a gente boa de Urandi
    Marcos Bandeira

    ResponderExcluir