quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

FRASE DE GOETHE

" ENQUANTO NÃO ESTIVERMOS COMPROMISSADOS, HAVERÁ HESITAÇÃO, A POSSIBILIDADE DE RECUAR, E SEMPRE, A INEFICÁCIA. EM RELAÇÃO A TODOS OS ATOS DE INICIATIVA( E DE CRIAÇÃO), EXISTE UMA VERDADE ELEMENTAR - CUJA IGNORÂNCIA - MATA INÚMEROS PLANOS E IDÉIAS ESPLÊNDIDAS: QUE NO MOMENTO EM QUE DEFINITIVAMENTE NOS COMPROMISSAMOS, A PROVIDÊNCIA DIVINA TAMBÉM SE PÕE EM MOVIMENTO. TODOS OS TIPOS DE COISAS OCORREM PARA NOS AJUDAR, O QUE EM OUTRAS CIRCUNSTANCIAS NUNCA TERIAM OCORRIDO. TODO UM FLUIR DE ACONTECIMENTOS, FORMAS DE COINCIDÊNCIAS , ENCONTROS E AJUDA MATERIAL, QUE NENHUM HOMEM JAMAIS PODERIA TER SONHADO ENCONTRAR EM SEU CAMINHO, SURGE A NOSSO FAVOR, COMO RESULTADO DA DECISÃO. QUALQUER COISA QUE POSSA FAZER OU SONHAR. A CORAGEM CONTÉM EM SI MESMA, O PODER, O GÊNIO E A MAGIA"

GOETHE

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO

MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE  INTERNAÇÃO





É sem dúvida a forma mais drástica de intervenção estatal na esfera individual do cidadão, pois o poder sancionatório do Estado alcança o jus libertatis do adolescente, o maior bem que se possui, depois da vida. Evidentemente que essa intervenção deve ser excepcional e marcada pela brevidade – normas-garantias -, pois o direito de punir do Estado, no âmbito da corrente minimalista, deve ser a ultima ratio, devendo-se, pois, observar o devido processo legal, assegurando-se aos adolescentes todas as garantias constantes da Constituição e do ECA, principalmente o direito à ampla defesa e ao contraditório. A Promotora de Justiça e professora Marta Toledo , discorrendo sobre o tema, assim se pronuncia:

...deixo anotado que os direitos-garantias do contraditório e da ampla defesa incidem integralmente para os adolescentes autores de crimes, já não fosse pelas normas gerais do Artigo 5º, por força também da disposição específica do inciso IV, do § 3º do Art. 227 da CF...Os direitos-garantias da reserva legal, da culpabilidade, do contraditório e da ampla defesa não estão essencialmente ligados a uma peculiaridade de crianças e adolescentes, a particularidade que seja exclusiva ou basicamente própria deles, embora a liberdade da pessoa física em fase de desenvolvimento não deixe de ter suas especificidades.

Como se infere da leitura do Art. 122 do ECA, o adolescente só poderá sofrer a privação de sua liberdade – internamento – nos casos taxativamente previstos no referido dispositivo legal, ou seja, quando cometer ato infracional mediante grave ameaça ou violência à pessoa; quando houver reiteração no cometimento de outras infrações graves e, finalmente, quando descumprir medida socioeducativa anteriormente imposta. O juiz Guaraci Viana , com aguda percepção, explicita:

Apegados à vigência da legislação anterior, na qual medida privativa de liberdade tinha como pressuposto uma categoria sociológica vaga, “ o ato anti-social”, muitos operadores do direito ainda não se deram conta de que, , com o advento do ECA, a medida de internação passou a ser regida pelo princípio da legalidade estrita. Vale dizer, somente pode ser aplicada nos casos previstos em lei, nas hipóteses definidas a priori, para situações de fato precisas. Absurdo que o cidadão não possa saber antecipadamente o que pode fazer ou deixar de fazer para evitar a perda de sua liberdade.(...). Os casos de privação de liberdade são somente aqueles previstos no Art. 122 (exceto a internação provisória) do estatuto, sendo absolutamente ilegal a manutenção de jovem internado fora das hipóteses taxativamente descritas.

Assim, a interpretação deve ser restritiva, não se admitindo qualquer elastério ou recurso à analogia, pois o internamento, como a ultima ratio, deve ser reservada para aqueles casos taxativamente previstos no Art. 122 do ECA, e desde que não comporte a aplicação de medida socioeducativa mais branda, conforme reiterado entendimento do STJ.

Com efeito, no que concerne ao inc. I do Art. 122 do ECA, torna-se imprescindível que o ato infracional seja praticado com grave ameaça à pessoa, v.g., roubo, inclusive, com a utilização de arma, ainda que brinquedo para amedrontar, atemorizar, minando a capacidade de resistência da vítima, constituindo-se, assim, elementar da “grave ameaça”. A grave ameaça pode acontecer, por exemplo, nos crimes de estupro e atentado violento ao pudor, o que poderá ser aferido através de provas testemunhais.

No que toca à violência, é indispensável que se comprovem as lesões, através de exames periciais, como ocorre nos atos infracionais similares aos tipos descritos nos Arts. 121 e 129 do Código Penal Brasileiro – homicídio e lesões corporais -, valendo ressaltar que havendo impossia bilidade absoluta de se realizar o exame pericial direto, admite-se o indireto, através de provas testemunhais e documentos, todavia, há decisões que não exigem, por exemplo, na prática de ato infracional similar ao delito de tráfico de drogas, o laudo toxicológico definitivo, bastando o laudo prévio, desde que corroborado pelas demais provas constantes dos autos, como confissão do adolescente e provas testemunhais que sejam capazes de convencer o juiz da existência de provas de autoria e da existência do ato infracional. Na verdade, não se está violando nenhuma garantia constitucional em relação ao adolescente em conflito com a lei, mas, simplesmente, adotando o sistema do livre convencimento ou da persuasão racional, pelo qual o juiz julga a partir do seu simples convencimento e lastreado nas provas produzidas nos autos. Na verdade, a prova absoluta do laudo pericial é uma reminiscência do sistema tarifário de provas, já repudiado pela maioria das legislações modernas. O juiz fluminense Guaraci Vianna , discorrendo sobre o tema, assevera:

O legislador estatutário optou por um sistema diferente de provas para a imposição da medida sócio-educativa. Diferentemente do processo criminal, onde a prova da materialidade é solenemente absoluta, o ECA optou pela relatividade da prova da materialidade. Assim, por exemplo, no caso de tráfico de entorpecentes, entende-se suficiente o laudo prévio.

No caso de crimes contra o patrimônio, a prova testemunhal é suficiente, sendo desnecessário o laudo de avaliação de res.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro também vem adotando esse posicionamento, como se observa:

APELAÇÃO. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. FATO ANÁLOGO AO DISPOSTO NO ART. 12 C/C ART. 18,III, AMBOS DA LEI Nº 6.368/76. PROVA SUFICIENTE DA AUTORIA E MATERIALIDADE. DESNECESSIDADE DE LAUDO DEFINITIVO. MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE INTERNAÇÃO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO.

[ ...] não é fácil a prova decorrente de depoimentos de policiais que, após denúncia, apreenderam o menor, em uma casa, juntamente com outros adolescentes, sendo com eles encontrada considerável quantidade de substância entorpecente (176,7 g) e vários sacos plásticos próprios para a endolação da droga, se tais depoimentos são coerentes e harmônicos, não se contrapondo a eles, qualquer prova contrária....A ausência de laudo prévio, aliado ao auto de apreensão e aos demais elementos probatórios, exclui qualquer dúvida de que a substância apreendida é entorpecente. Outrossim, se medida anterior de semiliberdade, aplicada anteriormente ao menor, por prática de conduta equiparada a roubo qualificado, foi inócua e incapaz de recuperá-lo, tendo ele se evadido, imperiosa a adoção de nova alternativa para melhor adequação às suas necessidades pedagógicas e ressocializadoras. Recurso improvido (1ª Cm. Criminal. Ap. 139/2002. Rel. Des. Paulo Salomão).

“ Habeas corpus – ECA – Medida Socioeducativa de internação. Ato análogo ao crime previsto no art. 12 c/c o Art. 18, III da lei 6.368/76. Autoria inconteste – materialidade comprovada suficientemente pelo laudo prévio – art. 114 do ECA – adolescente com diversas passagens anteriores pelo Juizo de Direito da Vara da Infância e da Juventude – Clamorosa necessidade da medida aplicada. Inocorrência da alegada coação ilegal. Ordem denegada (2ª Cam. Criminal . HC 2055/2003-11-27 . rel. des. Telma Musse Diuana).

É de se ver que, mesmo em casos de prática de atos infracionais graves, praticados com violência ou grave ameaça, nem sempre o juiz da Vara da Infância e Juventude deverá aplicar a medida extrema do internamento, pois o caráter excepcional da medida insculpido no § 2º do Art. 122 do ECA exige que “em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida adequada”, o que equivale a dizer que o juiz deverá valer-se de estudo técnico realizado por equipe interdisciplinar, o qual deverá lhe fornecer subsídios para encontrar a medida socioeducativa mais adequada para aquele caso concreto que lhe foi submetido.

Como se sabe, a questão envolvendo adolescente ao qual se atribui a prática de atos infracionais transcende ao aspecto meramente jurídico, em face do caráter pedagógico da sanção educativa destinada a pessoa em desenvolvimento, cuja personalidade ainda não está totalmente formada. A outra hipótese elencada no inc. II do Art. 122 do ECA refere-se à reiteração no cometimento pelo adolescente de atos infracionais graves. O ECA não define o que seja ato infracional grave. Logo, aplicar-se-á, subsidiariamente, as disposições do Código Penal Brasileiro, porquanto não incompatíveis com a essência da tutela diferenciada, no sentido de considerar infrações graves todos os atos infracionais que não sejam similares às contravenções penais e crimes de menor potencial ofensivo. Destarte, qualquer ato infracional similar a crime cuja pena ultrapasse a dois anos será, à luz do ECA, infração de natureza grave. Esse dispositivo se afigura defeituoso, pois retira da autoridade judiciária o poder de aplicar a medida extrema do internamento, em caso de ato infracional grave, quando as circunstâncias e a própria personalidade do adolescente indicarem que o internamento é a medida necessária e a mais adequada, mesmo que não haja reiteração, em face, principalmente, da periculosidade demonstrada pelo adolescente e sua total inaptidão para responder uma medida sócio-educativa de semiliberdade ou em meio aberto.

Existem situações em que o profundo envolvimento do adolescente com as drogas e com o mundo do crime indicam o internamento como a medida mais adequada. Veja, verbi gratia , o caso de um adolescente que trafica drogas pesadas como crack e cocaína e que é flagrado portando uma metralhadora ou um fuzil AR 15. O juiz, nesse caso, à luz do disposto no Art. 122, II do ECA, não poderá aplicar a medida socioeducativa do internamento, em face da ausência de reiteração. Trata-se de uma falha gritante do ECA e que precisa ser corrigida o mais rápido possível. Dessa forma, como se infere, o juiz só poderá aplicar a medida de internamento, se o adolescente já responde por outros atos infracionais graves, ou caso se trate de concurso material de atos infracionais graves.

Nesse caso, configurando-se a reiteração, o juiz poderá aplicar o internamento por prazo não superior a três anos. Finalmente, no que tange ao inc. III do Art. 122 do ECA, o juiz poderá aplicar a medida de internamento por prazo não superior a três meses, se o adolescente descumprir, injustificadamente, qualquer medida socioeducativa imposta pela autoridade judiciária. A doutrina denomina essa espécie de internamento de internação-sanção. O juiz fluminense Guaraci Viana discorrendo sobre o tema, explicita:

“Quando o jovem descumpre reiterada e injustificadamente medida anteriormente imposta, pode receber, nos termos do art. 122, inciso III, medida de internação por até três meses ( Art. 122, parágrafo 1º do ECA). Tal medida é conhecida nos meios forenses como “internação-sanção” .

É curial, para a efetiva aplicação da medida, que o Juiz da Vara da Infância e Juventude, ao ser comunicado do descumprimento da medida socioeducativa, anteriormente imposta, designe audiência para a ouvida prévia do adolescente, acompanhado de seu respectivo advogado ou advogado dativo nomeado pelo juiz - podendo ser defensor público com atuação na respectiva Vara -, presente, também, o promotor de justiça.

Com efeito, constatando a reiteração, o juiz analisará os motivos que determinaram o descumprimento, no sentido de verificar se há alguma justificativa plausível para o proceder do educando, principalmente se o fato ocorreu por culpa do estabelecimento responsável pela execução da medida anteriormente imposta. Caso não haja um motivo plausível, evidentemente que o juiz está autorizado a decretar o “internamento-sanção” por prazo não superior a três meses, de forma motivada, assegurando-se, assim, na sua plenitude, o direito do adolescente à ampla defesa e ao contraditório. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça vem decidindo, pacificamente, como se observa pela leitura dos seguintes arestos:

A regressão do paciente foi determinada sem a necessária oitiva do mesmo, sem observância dos postulados constitucionais do contraditório e da ampla defesa, malferindo-se ainda o disposto no art. 110 do ECA ( HC 8836 – STJ).

A tutela do menor infrator merece maiores cuidados que aquela deferida ao maior delinqüente. Assim, a ampla defesa deve ser observada ainda com rigor quando se tratar de processos disciplinados pelo ECA. No caso dos autos, o menor não foi ouvido, não tendo a oportunidade de se manifestar a respeito do descumprimento da medida sócio-educativa(...) Esta corte tem entendido que a decisão que determina a regressão de medida de semi-liberdade para internação, por constituir restrição ao status libertatis, não pode prescindir da oitiva do adolescente infrator, sob pena de nulidade, por ofensa ao postulado constitucional do devido processo legal.

Impõe-se asseverar, por oportuno, que a medida soioeducativa de internamento não comporta prazo determinado, muito embora não possa ultrapassar o limite de três anos, nos termos estabelecidos pelos §§ 2º e 3º do Art. 121 do ECA, devendo o educando ser submetido a avaliações periódicas, no máximo, a cada seis meses, ou sempre que o juiz determinar.

Aqui, sobressai o caráter pedagógico da medida que, a despeito de não abrir mão do seu caráter retributivo – imposição de sanção pelo mal praticado – foca o seu fundamento básico na educação voltada para a introjeção de valores no adolescente em conflito com a lei, ainda em processo de desenvolvimento, no sentido de fazer com que possa refletir e retornar a conviver, pacificamente, no seio social, tornando-se um cidadão e afastando-se da criminalidade, de sorte que lhe seja propiciado, no menor espaço de tempo possível, recuperar o seu status libertatis, indispensável para o seu pleno desenvolvimento físico, intelectual, moral e espiritual, o que se faz através de acompanhamento individualizado levado a efeito por equipe interdisciplinar, com intervenções, inclusive, na família do jovem. É lapidar a lição de Flávio Américo Frasseto ao abordar essa temática:

A privação de liberdade tem tempo indeterminado (art. 121, § 2º do ECA) justamente para que se possa respeitar o ritmo de cada pessoa, individualizando-se a reprimenda conforme as necessidades pessoais de cada um. Se lidamos com o universo subjetivo do homem e com o impacto gerado pela segregação e pela intervenção pedagógica em cada indivíduo, nosso tempo é o tempo psicológico. Aquele tempo traduzido no espaço dos relógios e calendários pouco tem, aqui, de significativo (pg. 197, ).

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

JUSTIÇA DA BAHIA FICA EM 1º LUGAR EM NÚMERO DE AUDIENCIAS DE CONCILIAÇÕES REALIZADAS

Presidente Telma Britto recebe o prêmio das mãos do juiz Walter Nunes, conselheiro do CNJ, pelas ações do Balcão de Justiça, uma das boas práticas adotadas pelo TJBA




No ranking dos 10 tribunais que mais se destacaram em todo o país em relação ao número de audiências realizadas, a Bahia ficou em primeiro lugar com 38.462 audiências.

Na seqüência estão outros Tribunais: Tribunal de Justiça de Goiás (31.326), Tribunal de Justiça de São Paulo (21.809), Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª. Região/SP (17.246) e Tribunal de Justiça de Minas Gerais (15.956). Além do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (15.519), Tribunal de Justiça do Maranhão (12.742), Tribunal Regional do Trabalho da 1ª. Região (11.384), Tribunal de Justiça do Amazonas (8.987) e Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (8.605).



O balanço final da 5ª edição da Semana Nacional de Conciliação foi divulgado durante o IV Encontro Nacional do Judiciário, que está sendo realizado no Rio de Janeiro. A presidente Telma Britto, o corregedor-geral da Justiça Jerônimo dos Santos e o juiz assessor da Presidência, Ricardo Schmitt participam do encontro.



O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contabilizou 303.479 audiências realizadas na última semana (entre 29 de novembro e 3 de dezembro), em 51 dos 91 tribunais brasileiros.



O atendimento alcançou um total de 702.219 pessoas. Mais de 80% das audiências marcadas (375.416) foram realizadas, o que resultou na formalização de 140.225 acordos. Em valores homologados, chegam a R$ 798,07 milhões.



O valor médio nos acordos homologados por parte foi de R$ 5,6 mil. Já em relação ao total arrecadado para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e de Imposto de Renda (IR), em face dos acordos realizados, o montante foi de R$ 64,8 milhões.



A Semana Nacional da Conciliação, além de ter sido marcada pela realização de grandes acordos, sobretudo de causas que envolveram empresas e trabalhadores, mobilizou, de um modo geral, 83.616 participantes, entre magistrados, juízes leigos, conciliadores, colaboradores e servidores dos tribunais.



Balcões - Os vencedores do prêmio Conciliar é Legal, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), também foram anunciados durante o encontro. Na cerimônia de entrega da premiação, o presidente do CNJ, ministro Cezar Peluso, destacou a importância dos vencedores e homenageados "para a implantação de uma cultura de conciliação no País". Ao todo, 101 práticas foram inscritas para concorrer ao prêmio.



E mais uma vez a Bahia se destacou ficando com o prêmio de homenagem por boas práticas. De acordo com o CNJ, os Centros de Mediação e Orientação Jurídica a exemplos dos Balcões de Justiça do Tribunal de Justiça da Bahia servem de referência para todo o País.



Para o juiz assessor da Presidência, Ricardo Schmitt "tanto a premiação quanto o destaque por termos realizados o maior número de audiências em todo País só nos confirma que estamos no caminho para aproximarmos cada vez mais a justiça do cidadão. Essa é uma vitória do

judiciário mas, sobretudo, da sociedade que segue para a Conciliação com o espírito de paz. Com o desejo real de ver seus problemas resolvidos", concluiu.



Texto: Ascom TJBA e site do CNJ











































































5ª Av. do CAB, nº 560, Salvador/BA - Brasil. CEP 41745-971. Fone: (71) 3372-5686/5688/5689.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

MINISTRO DO STF DEFENDE INTEGRAÇÃO ENTRE PODERES PARA COMBATER SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS

Peluso defende integração entre poderes para combater sequestro internacional de crianças





Durante o 2º Seminário sobre Subtração Internacional de Crianças, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso, destacou a importância de uma cooperação entre os Três Poderes da República em defesa dos direitos humanos. Nesse sentido, citou os avanços do Pacto Republicano. Segundo o ministro, o STF e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) têm “contribuído de forma decidida para essa empreitada comum”.



Cooperação internacional



Em relação à Convenção de Haia de 1980 sobre subtração internacional de menores, ele definiu como um “acordo internacional que lança pontes entre sistemas jurídicos distintos para reforçar a segurança jurídica e garantir os direitos das crianças”.



Peluso lembrou que durante a Presidência da ministra Ellen Gracie, em 2006, o STF criou um grupo de trabalho permanente com a missão de divulgar a convenção entre os operadores jurídicos, fomentar estudos de pesquisa e fornecer elementos de auxílio para a interpretação e aplicação do tratado internacional.



O grupo é integrado por representantes da Justiça Federal, da Secretaria de Direitos Humanos, do Ministério das Relações Exteriores (MRE), da Advocacia Geral da União (AGU) e do Ministério Público Federal. Ele funciona como apoio para acelerar o cumprimento da convenção e, entre outros avanços, já criou um projeto de lei que será enviado ao Congresso Nacional para disciplinar a aplicação da convenção no território brasileiro, com regulamentação do devido procedimento judicial.



Além disso, está prevista a criação de classes processuais específicas sobre o sequestro internacional de crianças em sistema informatizado da Justiça Federal, para facilitar o controle da tramitação de todos os processos sobre o tema. Haverá ainda um banco de dados nacional para tornar possível a identificação de todas as ações que tramitam na Justiça Estadual e na Justiça Federal sobre crianças retiradas de suas famílias.



Juiz de família



O presidente do Supremo lembrou que esse tema é especialmente importante para ele, uma vez que atuou como juiz de família durante oito anos e guarda a lição de “alto grau de cuidado, sensibilidade e responsabilidade que as questões jurídicas, em que os objetos são interesse de crianças, exigem do profissional de direito”.



Diplomacia judicial



Peluso destacou que a diplomacia judicial deve ser entendida como um “intercâmbio necessário entre Cortes domésticas e estrangeiras com vistas a aprimorar a prestação jurisdicional diante das novas realidades engendradas pela crescente interdependência entre as nações”.



O ministro finalizou seu discurso destacando as três principais vertentes do seminário: o empenho em favor da garantia dos direitos da criança, o diálogo entre distintos sistemas jurídicos e a cooperação entre os três Poderes no plano interno.



“A efetiva implementação dos direitos da criança pode ser vista como a concessão à sociedade de hoje de um direito ao futuro”, disse. "Tenho a esperança de que eventos como este trarão novos aliados para esse esforço coletivo de construção do futuro”, concluiu.



AGU



O representante da AGU, Fernando Luiz Albuquerque, destacou que o Supremo tem reconhecido a supralegalidade de tratados e convenções que tratam dos direitos humanos. E, com isso, tem entendido a necessidade de acelerar a tramitação e o julgamento de processos dessa natureza, “sempre atento ao interesse da criança”.



Secretaria de Direitos Humanos



O ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, também destacou a ação de parceria entre os Três Poderes, agradeceu a presença do ministro Peluso no seminário e citou as ações do CNJ nos mutirões carcerários e no combate à exploração de crianças e adolescentes.



Ele ressaltou que o Brasil tem 22 anos de democracia e que o país começa a florescer para superar as desigualdades.



Programação



O seminário ocorre durante todo o dia de hoje no Centro de Convenções do Edifício Brasil XXI, em Brasília, e continua amanhã, com a participação de organismos internacionais de direitos humanos, procuradores, promotores, acadêmicos e juízes brasileiros, entre outros.








quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

REMISSÃO CLAUSULADA COMO NOVO MODELO DE JUSTIÇA CONSENSUALIZADA

REMISSÃO CLAUSULADA COMO NOVO MODELO DE JUSTIÇA CONSENSUALIZADA




O assunto a ser colocado em pauta diz respeito à efetividade das medidas socioeducativas previstas no ECA, especialmente às cumpridas em meio aberto e semi-aberto, diagnosticando a crise do modelo clássico estatal de dizer, coercitivamente, o direito e apresentar alternativas consensualizadas e sintonizadas com as tendências contemporâneas do Direito.

Na verdade, a temática, certamente, não constitui nenhuma novidade, pois já está na Lei desde a entrada em vigor do ECA, ocorrida no dia 14 de outubro de 1990. Todavia, boa parte dos operadores do Direito, muitas vezes, em face da sobrecarga de trabalho verificado em suas Varas, ainda não se deu conta da profundidade de seu conteúdo e da sua importância para a resolução dos conflitos, envolvendo adolescentes a quem se atribui a prática de atos infracionais. Destarte, urge que se quebrem paradigmas e isso implica, necessariamente, mergulhar-se em si mesmo, para mudar de atitude e enxergar além do modelo clássico de jurisdição – dizer o direito , um outro modelo, cuja base é o consenso, como verdadeiro instrumento de resolução dos conflitos, envolvendo adolescentes a quem se atribui a prática de atos infracionais. Pode-se afirmar que esse modelo, o qual José Luiz Bolzan Moraes denomina de jurisconstrução, pode ser aplicado em 95% dos casos ocorridos na Vara da Infância e Juventude e representa uma das tendências do Direito contemporâneo, a exemplo do que já ocorre no Direito americano (com a Alternative Dispute resolution), na França, entre outros países. O juiz, que comumente realiza duas ou três audiências no sistema tradicional, para aplicar medidas socioeducativas em meio aberto – liberdade assistida ou prestação de serviços à comunidade -, pode realizar, numa assentada, num turno, cerca de 15 a 20 audiências para obter, pela lei do menor esforço, sem ouvida de testemunhas, alegações finais, sentença etc., a mesma resposta – medida socioeducativa -, só que esta construída pelo consenso e responsabilidade das partes envolvidas e com o parecer técnico da equipe interdisciplinar.

Esse é o ponto de partida para mudança de mentalidade e de posicionamento, abandonando, parcialmente, o velho sistema clássico, caracterizado pela lentidão dos procedimentos, repressão, oneração, inflexibilidade, e o que é mais grave, ineficiente para responder, adequadamente, aos conflitos que lhe são submetidos, e abraçar uma nova postura consentânea com a personalidade em desenvolvimento do adolescente, qualificada pelo consenso construído pelo juiz, promotor, adolescente e seu defensor, seus pais ou responsável, equipe interprofissional, em busca de uma resposta – medida socioeducativa – que seja adequada e suficiente para que o adolescente reflita sobre o ato que cometeu e possa, com a ajuda dos operadores sociais, introjetar valores que o credenciem a se distanciar do mundo das drogas e dos atos infracionais, caminhando seguro em direção à cidadania.

Nesse diapasão, é inevitável afirmar que o modelo tradicional repressivo-correcional está em crise, pois é manifestamente insuficiente, para responder ao grande fluxo de demandas, acentuado pela globalização da economia que fez do Brasil o vice-campeão em desigualdade social, só perdendo para Serra Leoa na África, aumentando assim os bolsões de miséria e a violência, principalmente, a praticada por adolescentes. Com efeito, verifica-se que a maioria dos atos infracionais praticados por adolescentes tem motivação econômica, o que torna seletiva essa clientela, ou seja, a classe marginalizada ou dos excluídos, daqueles que, segundo o juiz mineiro Tarcísio José Martins :

“... historicamente jamais tiveram acesso a condições mínimas de bem-estar e de dignidade, e que, portanto, nunca se reconheceram ou foram reconhecidos como cidadãos plenos pela sociedade e o Estado”.

O jurista Juarez Cirino dos Santos , ao discorrer sobre a seletividade, precisamente sobre o direito penal dos pobres, explicita:

“Sem dúvida, são eles que constituem a clientela do sistema e são por ele, virtualmente, oprimidos. Só os pobres sofrem os processos de vadiagem e só eles são vítimas das batidas policiais com o seu cortejo de ofensas e humilhações. Só os pobres são ilegalmente presos para averiguações, enquanto os ricos, que nunca vão para as prisões, livram-se facilmente, contratando bons advogados, recorrendo ao tráfico de influência e à corrupção. Em situações excepcionais quando isso vem a suceder, logo ficam doentes e são internados nos hospitais. Parece certo que a realização do sistema punitivo funciona como um processo de marginalização social, para atingir uma determinada clientela, que está precisamente entre os mais desfavorecidos da sociedade”.



O Brasil, segundo dados de recente pesquisa da ONU, tem 57,6 milhões de crianças, o que representa 35, 9% da população. Há 54 milhões de indigentes – pessoas que sobrevivem com menos de R$ 100,00 por mês –, ou seja, para quase três brasileiros um vive na linha da pobreza; cerca de 3,5 milhões de crianças nascem no país todos os anos, sendo que, em cada quatro, uma vive em absoluta pobreza. Uma criança em cem deixará de receber a vacina contra sarampo e poliomielite no seu primeiro ano de vida; 10% sofrerá de desnutrição nos primeiros cinco anos; 6% vive sem água potável e 14% sem saneamento básico; 10% dos adolescentes entre 15 a 17 anos deixarão de estudar para trabalhar .

A desigualdade social é gritante: 10% dos mais ricos detêm cerca de 50% da renda nacional, enquanto 50% dos mais pobres detêm menos de 10% da renda . Consoante documento referencial do SINASE, baseado em dados mais recentes do IBGE (IBGE, 2004), 1% população rica detém 13, 5% da renda nacional, contra os 50% mais pobres, que detêm 14,4%. Nesse universo existem 25 milhões de adolescentes entre 12 e 18 anos, representando aproximadamente 15% da população brasileira. No que toca à escolaridade, 92% da população de 12 a 17 anos estão matriculados, todavia, 54% ainda são analfabetos; 80% dos adolescentes entre 15 a 17 anos freqüentam as escolas, mas somente 40% estão no nível adequado para sua faixa etária; somente 11% dos adolescentes de 14 e 15 anos concluíram o ensino fundamental; a escolarização diminui à medida que aumenta a idade, sendo de 81,1 % entre os jovens de 15 a 17 anos, e de 51,4% com relação aos jovens entre 18 e 19 anos.

Existem, no Brasil, com base em dados da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, cerca de 39.578 adolescentes cumprindo medidas socioeducativas, sendo que 90% que cumpriam medida de internação eram do sexo masculino; 76% tinham idade entre 16 e 18 anos; 63% não eram brancos e destes 97% eram afro descendentes; 51% não freqüentavam a escola; 90% não concluíram o ensino fundamental; 49% não trabalhavam; 81% viviam com a família quando praticaram o ato infracional; 12,7% viviam em famílias que não possuíam renda mensal, 66% em famílias com renda mensal de até dois salários mínimos; e 85% eram usuários de drogas.

Segundo Waiselfisz , a morte por causas externas, entre a população jovem, é de 72%; destas 39,9% referem-se a homicídios praticados contra a população jovem; já com relação à população idosa a taxa de óbito é de 9,8%, e destes, os homicídios representam apenas 3,3. Constata-se que os jovens morrem muito mais do que matam. Os homicídios praticados contra crianças e adolescentes chegam a 19.188, enquanto os praticados por eles somam 1.286, de acordo com dados do SINASE.

É sabido que, além dos fatores econômicos e sociais, o ato infracional é causado por fatores endógenos, como a inteligência, perturbações afetivas ou emocionais, sentimentos de perdas e grau de frustração, dentre outras. Todavia, os excluídos, a que certos setores da cidade, segundo Viviane Forrestier , consideram como “cidadãos descartáveis, incapazes de consumir ou se integrar ao mercado” constituem, sem dúvidas, a maior clientela da Vara da Infância e Juventude na área infracional.

Não se pode, neste novo milênio, tratar o direito infracional juvenil com eufemismo, a exemplo de direito penal juvenil, “direito penalzinho”, “peninha”, ”trombadinhas” e expressões que estigmatizam o adolescente, tratando-o como se fosse imputável, ou mesmo considerando-o como mero objeto, e não sujeito de direito, como proclamado nas regras de Beijing, acolhido pela Constituição Federal e pelo ECA, aceitando assim, passivamente, a ideologia expiatória do Código de Menores de 1979, representado, simbolicamente, pela desumanidade do que acontece na FEBEM, que é um modelo fracassado, ultrapassado e que já deveria ter sido implodido, como foi o Carandiru, pois não tem qualquer sustentação num Estado Democrático de Direito.

Deve-se tratar o Direito Infracional Juvenil como ele, ontologicamente o é, ramo diferenciado da Justiça, e a Vara da Infância como Vara especializada a exigir uma postura diferenciada dos juízes, promotores e advogados, na medida em que compreendam que as questões conflituosas, envolvendo adolescentes, não são simplesmente questões jurídicas. É muito mais que isso, são multifacetárias e exigem a concorrência de operadores sociais – assistentes sociais, psicólogos e pedagogos, psiquiatras – para que seja construída uma resposta adequada para determinada conduta típica praticada pelo adolescente. A questão é transdisciplinar e exige a concorrência de todos os protagonistas para a busca da medida sócio-educativa e/ou protetiva ideal para determinado caso concreto.

Vê-se que o sistema consensualizado oferece vantagens inúmeras e se afigura mais adequado para a resolução dos conflitos na área infracional juvenil, pois é mais célere, flexível, prepondera o princípio da oralidade, diminui os custos e é eficiente. Nesse sentido, José Luis Bolzan , na obra já citada explicita:

“Aparecem, assim, os mecanismos consensuais – apesar de suas distinções – como outra justiça na qual, ao invés da delegação do poder de resposta, há aproximação pelos envolvidos do poder de geri-los, caracterizando-se pela proximidade, oralidade, ausência/diminuição de custos, rapidez e negociação, como já dito, quando, na discussão do conflito, são trazidos à luz todos os aspectos que o envolvem, não se restringindo apenas àqueles dados deduzidos na petição inicial e na resposta de uma ação judicial cujo conteúdo vem pré-definido pelo direito positivo.

A questão que sobressai, aqui, é a de diferenciar a estrutura desses procedimentos, deixando de lado o caráter triádico da jurisdição tradicional, onde um terceiro alheio à disputa impõe uma decisão a partir da função do Estado de dizer o Direito, e assumindo uma função díade/dicotômica, na qual a resposta à disputa seja construída pelos próprios envolvidos.

É por isso que propomos como gênero o estereótipo jurisconstrução, na medida em que essa nomenclatura permite supor distinção fundamental entre os dois grandes métodos. De um lado, o dizer o Direito próprio do Estado, que caracteriza a jurisdição como poder/função estatal e, de outro, o elaborar/concertar/pactar/construir a resposta para o conflito que reúne as partes”.

Nessa linha de raciocínio, o professor e pós-doutor em Direito, Paulo Bezerra , em sua obra “Acesso à Justiça”, já convencido da ineficiência do combalido modelo clássico de dizer o direito, vaticinando, manifesta a tendência moderna de se procurar o consenso como forma de solucionar os litígios. Veja-se:

“Alem disso, não é de ninguém desconhecido que, modernamente, a tendência é abandonar soluções ditadas por terceiros, principalmente pelo Estado-juiz, buscando-se a paz por meio do consenso e da própria vontade. Isso tem conduzido os atores às formas autocompositivas de solução de conflitos, principalmente a negociação e a mediação, sendo visto o Estado como parceiro na resolução dos conflitos, já não como solucionador”.

Transpondo-se essas premissas para a área da infância e juventude, vê-se que o ECA, nos seus §§ 1º e 2º do Art. 186, já previa o consenso nos moldes da “transação penal” prevista na Lei nº 9.099/95, como forma de solucionar os litígios. Numa linguagem mais clara, previu a possibilidade de o adolescente, apontado como autor de um ato infracional, não ser privado de sua liberdade, nem de forma semiplena, desde que tenha aptidão e concorde, juntamente com o seu pai ou responsável, em cumprir uma medida sócio-educativa, em meio aberto, seja liberdade assistida ou prestação de serviços à comunidade. A remissão clausulada ou vinculada como forma de exclusão do processo nada mais é na sua essência do que a transação penal prevista no Art. 74 da Lei nº 9.099/95, só que, no ECA, sobressai o seu lado pedagógico, voltado para a condição peculiar do adolescente como sujeito de personalidade em formação, o que se pode denominar de transação socioeducativa. Na verdade, antes da Lei nº. 9.099/95, o ECA já previa a transação como forma de compor litígios envolvendo adolescentes. Vê-se também que já se admitia a remissão clausulada como forma de suspensão do processo nos mesmos moldes preconizados pela suspensão do processo penal, prevista no Art. 89 da Lei nº 9.099/95.

O jus libertatis do adolescente é preservado, mas a medida busca despertar o senso de responsabilidade do jovem, diante do ato que lhe é imputado, objetivando o afloramento de valores que dignifiquem o ser humano, como respeito ao próximo, honestidade, educação, trabalho, orientação espiritual, ao tempo em que procura reintroduzi-lo na sociedade que o deixou à margem, através da educação e da inserção no mercado de trabalho.

Como se observa, o legislador previu um ritual para os casos considerados graves – o que deve ser analisado caso a caso – estabelecendo o seguinte in verbis:

“Art. 186 – Omissis

§ 1º - Omissis

§ 2º - Sendo o fato grave, passível de aplicação de medida de internação ou colocação em regime de semi-liberdade, a autoridade judiciária, verificando que o adolescente não possui advogado constituído, nomeará defensor, designando, desde logo, audiência em continuação, podendo determinar a realização de diligências e estudo do caso”.

Como se depreende, a contrario sensu, não sendo o caso grave, ou seja, desde que o ato infracional imputado ao adolescente seja de pequeno ou médio potencial ofensivo, o Juiz, na própria audiência de apresentação, quando o Ministério Público não utilizar da prerrogativa do Art.180, I do ECA, requerendo a remissão clausulada, deverá, após receber a representação, ouvi-lo no ato de audiência, nos termos preconizados pelo § 1º do Art. 186 da Lei nº 8.069/90, a respeito da possibilidade da remissão, ouvindo em seguido o adolescente e seus pais ou responsável, bem como seu defensor, e depois, com o assessoramento de equipe técnica – pedagogos, psicólogos e assistentes sociais – deverão juntos buscar a medida mais adequada para aquele caso.

Importante salientar que o adolescente a quem se atribui a prática de um ato infracional não deve receber um tratamento mais severo do que receberia o imputável – maior de 18 anos – autor da mesma transgressão, como imperativo das garantias processuais e constitucionais que asseguram ao adolescente, parte reconhecidamente vulnerável, um tratamento diferenciado em relação ao adulto. Desta forma, se o crime é de menor potencial ofensivo, ou se doloso, foi praticado sem violência ou grave ameaça, a pena não ultrapassa a 4 anos; ou se culposo, independente da quantidade de pena prevista abstratamente, comporta a aplicação de penas alternativas, sendo, pois, de rigor, afastar a aplicabilidade da medida extrema do internamento. Da mesma forma, se comporta em relação ao adulto, no máximo, o regime semi-aberto, como é o caso do injusto previsto no Art. 16 da Lei nº 6.368/76, afasta-se também o internamento, que é caracterizado pela brevidade e excepcionalidade. É bem de ver, conforme o escólio do Promotor Roberto Decoiman , de Santa Catarina, que a expressão “conceder”, descrita no Art. 180, II do ECA, não traduz, ,juridicamente, o seu sentido vernacular, pois não passa de uma proposta ou sugestão de remissão. Assim, preleciona o ilustre representante do Ministério Público:

“Exigida que é a homologação judicial da remissão ‘concedida’ pelo Ministério Público, venha ela ou não acompanhada da proposta de aplicação de medida sócio-educativa ao adolescente, bem se vê que o conteúdo da expressão “conceder” não corresponde a uma faculdade exclusiva, privativa, irrestrita e auto-executável do Ministério Público. Guarda ela os contornos de verdadeira sugestão.

Funciona, em verdade, como proposta de aplicação imediata de medida sócio-educativa ao adolescente, com o objetivo de evitar-se a instauração do procedimento subseqüente à oferta da representação.

Noutras palavras, na verdade, quem concede a remissão, seja ela pura e simples, seja acompanhada de medida sócio-educativa, não é o Ministério Público....quem na verdade concede, em última análise, a remissão, é a própria autoridade judiciária. Do mesmo modo, é ela quem aplica a medida sócio-educativa proposta”.

O instituto da Remissão está previsto nos seguintes dispositivos do ECA:

Art. 126 – Antes de iniciado o procedimento judicial para apuração do ato infracional, o representante do Ministério Público poderá conceder a remissão, como forma de exclusão do processo, atendendo às circunstâncias e conseqüências do fato, ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional.

Parágrafo Único – Iniciado o procedimento, a concessão da remissão pela autoridade judiciária importará na suspensão ou extinção do processo.

Art. 127 – a Remissão não implica necessariamente o reconhecimento ou comprovação de culpabilidade, nem prevalece para efeitos de antecedentes, podendo incluir eventualmente a aplicação de qualquer das medidas previstas em lei, exceto a colocação em regime de semi-liberdade e a internação.

Impõe-se enfatizar que, dadas as peculiaridades do caso, as circunstâncias, o contexto social e a personalidade do adolescente, é possível a remissão clausulada, mesmo em casos graves, praticados com violência ou grave ameaça, como v.g., no caso de homicídio, no qual se afigura possível uma justificativa – legítima defesa, legítima defesa putativa, inexigibilidade de conduta diversa – e o adolescente, com seu representante legal, sua anuência e com a assistência jurídica do seu defensor concordam em cumprir alguma medida socioeducativa em meio aberto, como liberdade assistida ou prestação de serviços à comunidade, para não discutir o meritum causae, e as condições familiares e sociais do adolescente indiquem o cumprimento de medida socioeducativa, em meio aberto, como resposta pedagógica mais adequada para aquele caso concreto.

Nesse caso, o Promotor, entendendo que a medida em meio aberto é adequada, já que o adolescente não encarna o perfil de jovem periculoso e familiarizado com o mundo do crime, e que, ao contrário, o fato foi isolado e as circunstâncias do ato infracional não descartam a possibilidade de que o mesmo tenha utilizado de alguma excludente de criminalidade ou culpabilidade, pode propor a aplicação da remissão cumulada com medida socioeducativa e/ou protetiva.

Essa mesma inferência pode ser aplicada em alguns casos praticados com violência ou grave ameaça, principalmente se o jovem foi um mero partícipe, pois nem sempre a gravidade do ato infracional ensejará a aplicação da medida socioeducativa de internamento. Impõe-se diferenciar a conduta do imputável que comete crime ou contravenção daquela praticada pelo adolescente. O ex-estudante da UESC, Rafael Fernandes Pimentel , com sutileza, expressou:

“Importante é lembrarmos que a transgressão é um fenômeno intrínseco à adolescência. A rebeldia e a contestação caminham paralelas a esta fase da vida do indivíduo. A conduta impulsiva típica do adolescente decorre necessariamente da crise de identidade por que passa. Contrastam, formando uma verdadeira mixórdia, as naturais transformações psíquicas e hormonal, o conseqüente comportamento transgressivo e questionador (...) por tudo isso, olhar para o adolescente reconhecendo sua diferença implica redimensionar o significado de seus atos, entendendo melhor a realidade para nela intervir eficazmente”.

É necessário, portanto, que o juiz conheça bem o contexto, a história do adolescente e fundamente a escolha pela internação, explicitando o motivo pelo qual não aplicou uma medida mais branda ao adolescente. Nesse sentido, o STJ vem se posicionando unissonamente, de acordo com o julgado abaixo:

“O cotejo entre o comportamento do menor e aquele descrito como crime ou como contravenção atua apenas como critério para identificar os fatos possíveis de relevância infracional, dentro da sistemática do ECA. Exatamente porque ao menor infrator se aplicam medidas outras de caráter educativo e protetivo sem critérios rígidos de duração, já que vinculados exclusivamente à sua finalidade essencial” (HC 10.679).

“Se o adolescente, além de trabalhar e estudar, cumprir toda a medida sócio-educativa de liberdade assistida, tendo o relatório técnico da FEBEM informado não revelar mais tendência infracional e ter condições de convívio social, o fundamento básico do acórdão atacado, gravidade da conduta (tentativa de latrocínio) não têm força bastante para afastar essas constatações, mesmo porque, a internação é medida extrema, cabível quando o caso não comporta outra menos grave”.

“O fundamento básico do acórdão, que consubstanciou-se na gravidade da conduta – não é suficiente para motivar a privação total da liberdade do menor, tendo em vista a própria excepcionalidade da medida de internação”.

Como se depreende, a remissão clausulada não implica reconhecimento de culpa e nem configura antecedentes, podendo ser utilizada várias vezes, desde que o jovem tenha, efetivamente, condições de cumprir a medida socioeducativa que vier acompanhada em meio aberto. Com efeito, pode-se afirmar que esta forma de composição de litígios não elimina o modelo tradicional, pois haverá casos em que o Promotor não entenderá cabível o cumprimento da medida em meio aberto ou preferirá o devido processo legal.

Da mesma forma, se o defensor do adolescente sustentar a tese da negativa de autoria ou da existência de alguma excludente de ilicitude e manifestar o propósito de provar sua inocência a qualquer custo, no âmbito do devido processo legal e da mais ampla defesa, será necessário o procedimento. Verificar-se-á, entretanto, que poucos serão os casos reservados para o modelo clássico, pouco mais de 5%, o que, sem dúvida, é muito pouco e confirmará apenas a supremacia do modelo consensual de composição de litígios.

O modelo consensual, por sua vez, contribuirá para desemperrar a máquina judiciária, fazendo incidir o princípio da economia processual e da corrente minimalista do direito infracional juvenil, reservando-se para a semiliberdade e o internamento os fatos, comprovadamente graves, e praticados com grave ameaça ou violência, e que demonstrem a necessidade de medidas que atinjam o status libertatis do jovem autor de ato infracional. O internamento é regido pelo princípio da legalidade estrita e só deve ser aplicado aos casos, taxativamente previstos, no Art. 122 do ECA, já que se trata de medida excepcional e que não admite interpretação extensiva. Assim, vêm reconhecendo alguns julgados do STJ que consideram ilegal o internamento de adolescente primário no caso de tráfico de drogas .

Portanto, o internamento deve ser a ultima ratio e reservado, exclusivamente, quando houver violação de bens jurídicos relevantes na comunidade – homicídio, estupro, roubo, extorsão mediante seqüestro etc., e que, numa análise geral do caso, seja inviável o cumprimento da medida em meio aberto ou semi-aberto, seja porque o jovem, familiarizado com o mundo das drogas e dos atos infracionais, revele inaptidão para o convívio social, seja porque fatores endógenos – inteligência, perturbações afetivas ou emocionais, predisposição do adolescente à delinqüência, sentimento de perda no grau de frustração, dentre outros – adicionados à gravidade da conduta recomendem o internamento, como forma necessária e preparatória para a progressão para a semiliberdade ou meio aberto.

Na verdade, mesmo fora dos casos de remissão clausulada – transação socioeducativa – é possível o consenso com relação à aplicação da medida de semiliberdade, desde que comprovada a autoria e materialidade do ato infracional, o defensor do acusado, durante a audiência de instrução, apoiado em relatório técnico, se convença que a semiliberdade seja, de fato, a medida mais adequada para aquele caso. É possível até que o defensor do acusado, após a confissão do representado, não havendo dúvidas sobre a autoria e demais circunstâncias do fato, entenda desinfluente a ouvida das testemunhas arroladas na defesa prévia e as dispense, abreviando, assim, o procedimento, sem que sejam violados os princípios do devido processo legal e da ampla defesa, ensejando que o juiz aplique a medida de semiliberdade em consonância com o pensamento do Ministério Público, do adolescente e de seu respectivo defensor. Pode-se ainda alinhar mais um motivo plausível para que se excepcione o internamento, e se prefira o cumprimento da medida socioeducativa em meio aberto ou semi-aberto, mercê da condição natural de liberdade do jovem em desenvolvimento. É o seu alto custo, que, segundo estudos desenvolvidos em alguns Estados fica na ordem de R$ 1.500,00 por adolescente e a reincidência, em alguns, casos chega a 70% , enquanto o cumprimento da liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade, em alguns Estados, onde são aplicadas corretamente, como em Joinvile-SC, além do custo ser bem menor, os índices de reincidência em 1999 ficaram na ordem, respectiva, de 7 e 5%.

O importante é que se tenha uma estrutura física e humana capaz de executar as medidas sócio-educativas em meio aberto e semi-aberto, preenchendo, assim, uma lacuna que os juízes e promotores da Vara da Infância e Juventude enfrentam no seu dia-a-dia da atividade forense, utilizando-se, muitas vezes, da improvisação e amadorismo, para suprir suas carências. Na Bahia, felizmente, a Fundação Reconto e a Fundac, de forma revolucionária, vêm executando medidas socioeducativas em meio aberto e semi-aberto, em Canavieiras, Ilhéus e Itabuna, com resultados expressivos, fundamentadas na metodologia da Escola Dinâmica Energética do Psiquismo e na Pedagogia da Presença.

“... que busca fazer-se presente de forma construtiva na vida do adolescente, educando-o e auxiliando-o a resgatar a sua auto-estima, a crescer, a progredir, a assumir a vida e a perceber a grande possibilidade que é a vida e aprender a viver conscientemente.” (COSTA, Antonio Carlos Gomes da, 2001) .

Dessa forma, é fundamental que o adolescente se torne protagonista de sua própria história. A idéia da vingança e da mera expiação é substituída pela presença construtiva do educador na vida do jovem infrator, estabelecendo um vínculo de confiança, respeito e tolerância, pelo qual será perfurada a couraça do adolescente e tocada a centelha divina que está em cada um desses jovens, fazendo-o enxergar os seus limites, reconhecer o seu potencial e atingir as metas estabelecidas pelo educador. Os operadores sociais, dependendo da medida a ser aplicada – liberdade assistida, prestação de serviços à comunidade ou semiliberdade, estudam cada caso, fazem trabalho de redes e parcerias, acompanham o jovem na sua relação familiar e na escola, fortalecem os vínculos familiares, inserem-no em oficinas profissionalizantes, de conformidade com a aptidão de cada um, acompanham o aproveitamento escolar e promovem, socialmente, o jovem, fazendo o trabalho de inclusão social e preparando-o para ser verdadeiramente um cidadão.

Este, na verdade, é o grande desafio de todos que mourejam nas Varas da Infância e Juventude: evitar que o adolescente, cuja personalidade ainda está em formação, transforme-se em um delinqüente. Assim, ter-se-á motivos de sobra para sonhar e acreditar que o amanhã será bem melhor para futuras gerações, como disse Juarez Oliveira, prefaciando a obra de Paulo Lúcio Nogueira :

 “Antes do sonho há um dever a ser cumprido, dever que é de todos nós. O menor é nosso; seu problema é nosso, como o dever de sua melhor construção também é nosso”.