sexta-feira, 18 de março de 2011

QUANDO CHEGA A HORA DA UTI

QUANDO CHEGA A HORA DA UTI










È possível que cada um de nós já tenha tido alguma experiência com UTI – unidade de terapia intensiva –, seja pessoalmente, seja com algum ente querido ou amigo. Se você ainda não teve essa experiência, certamente terá ao longo de sua existência. Se não tiver, será, sem dúvida alguma, um privilegiado nesta vida efêmera e sofrida. Pode suceder, também, o que será uma fatalidade, que você venha a morrer prematuramente.

A antessala da UTI, uma espécie de sala dos passos perdidos, nos retira abruptamente do cotidiano de nossas vidas e nos convida para outro mundo completamente diferente. Cada um que está naquela sala e aguarda ansiosamente a hora de visitar o seu ente querido ou amigo está com o coração afetado. Alguns com esperanças, muitos angustiados e todos temerosos de perder um ente querido ou amigo. A pessoa que está do seu lado muitas vezes está em uma situação muito mais grave do que a sua, e que você imaginava que era a pior das situações. Naturalmente, você acaba criando amizades na dor, e passa também a se preocupar com a saúde de outros pacientes, cuja amizade foi cultivada ali naquela sala. As pessoas acabam tranquilizando-o, trazendo alguma palavra de esperança, e você, por sua vez, acaba também levando alento e ajudando a enxugar as lágrimas do próximo. A maca, que sai da UTI de repente, desperta a atenção de todos. Se se trata de algum paciente que obteve alta, todos, invariavelmente, sentem interiormente um alento e alimentam a esperança de que o seu também venha a experimentar aquele momento. A imagem positiva é projetada para o seu ente querido. Todavia, se o paciente veio a falecer, a cena contagia a todos, que ficam angustiados, pensando no pior.

O paciente pode levar dias ou meses ali. Os dias que se seguem são angustiantes e dolorosos, pois as notícias sobre o seu estado de saúde são escassas e as visitas reduzidas. A hora de dormir é o pior momento, pois você vai para a cama sem saber ao certo como ele estará, e acaba temeroso de que, na madrugada, ou no dia seguinte, o telefone toque e venha uma notícia ruim. Quando você tem aproximação ou amizade com um médico ou enfermeiro, a situação é amenizada, mas não elimina o sofrimento, pois a qualquer momento pode ocorrer uma intercorrência. O sono muitas vezes não chega, e você passa a noite em claro.

Na sala de UTI, é comum observarmos a alegria de alguém que visitou o seu ente querido e está feliz pelo simples fato dele ter aberto os olhos, ou mexido uma das pernas, ou balbuciado algumas palavras. Isso tudo nos leva a uma reflexão bastante profunda sobre o nosso cotidiano. Chegamos à conclusão de que somos simples mortais, e que a vida é finita e a felicidade é feita de coisas simples. Como é bom respirarmos o ar puro, observarmos a paisagem, os pássaros, os mares, a lua, as estrelas, andarmos, falarmos...como é bom vivermos. Voltando para o nosso cotidiano, passamos a entender que os homens inventaram um mundo onde alguns valores não têm nenhum sentido, e levam inexoravelmente à depressão e à infelicidade. Sentimentos como rancor, inveja, soberba, indiferença, arrogância, egoísmo não fazem bem a nossa alma. A nossa alma é libertária e tendendiosa à evolução, e só é preenchida pelos sentimentos de amor, solidariedade, amizade, misericórdia, dignidade, alteridade, simplicidade, verdade, compromisso com o outro, e da espiritualidade. Não vejo sentido na vida, a não ser que estejamos aqui, cada um com uma missão, um propósito: o de identificar suas potencialidades, para fazer o melhor para o outro e para a comunidade, realizar-se pessoal e profissionalmente, e contribuir, de alguma forma, para tornar este mundo mais humano e pacífico. A UTI nos chama para essa reflexão. Aproveitemos a vida, cada momento, da melhor maneira possível. Cultivemos os verdadeiros valores que nos dignificam como seres humanos, e vamos valorizar as coisas que recebemos de graça e que DEUS nos permite apreciar, seja através do olfato, da visão, da audição, do tato, como também através dos olhos da inteligência e da sensibilidade, pois amanhã pode ser tarde, ou até não existir, como dizia o poeta (que já se foi). De repente, não mais que de repente, pode vir um AVC, um enfarto, um acidente automobilístico, uma doença grave, e aí perceberemos o quanto vale verdadeiramente a vida. Ou, quem sabe, o que é pior, nem chegaremos a entender e experimentar a verdadeira felicidade aqui neste planeta.



Marcos Bandeira



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